Se pararmos para olhar o universo à distância, veremos que em seus primeiros momentos ele era bem simples, era um espaço cheio de matéria, algo sem caracteres ou características. Era o que na mitologia Hindu se chama de “Turiya” – palavra que descreve algo como “sem atributos”. Leva tempo para ocorrer uma transformação em reinos mais criativos. A pré-condição para a criatividade é o desequilíbrio, o que os matemáticos atualmente chamam de Caos. Através da vida do universo, à medida em que caíam as temperaturas, surgiam estruturas compostas cada vez mais complexas. A partir do estado de fecundidade criativa, manifestava-se mais criatividade. O universo é uma máquina de fazer arte, um motor para a produção de formas cada vez mais novas de se estar conectado, e da justaposição cada vez mais exótica de elementos díspares.
Cada artista é uma antena para o Outro Transcendental. Enquanto seguirmos com nossa própria história para dentro disso e criarmos confluências únicas de nossa singularidade e sua singularidade, nós criamos coletivamente uma flecha a partir da história, do tempo, talvez até a partir da matéria, a qual vai redimir a ideia de que os humanos são bons. Esta é a promessa da arte, e sua realização nunca esteve tão perto do momento presente.
Teoria Musical X: Progressão Harmônica
Hoje estaremos finalmente botando em uso os acordes estudados nos campos harmônicos. Esse será o ultimo post sobre teoria musical. Daqui em diante, começaremos com a série Harmonia Funcional, seguindo o métodos de Koellreutter com alguns insights de Kostka.
“Antes que você possa começar a compor música tonal convincente ou aprender alguma coisa das análises harmônicas, você presisa aprender quais sucessões de acordes são típicas da harmonia tonal e quais não são. Por que algumas sucessões de acordes parecem “progredir”, mover-se em direção a um objetivo, eqnuanto outras tendem a divagar, a não preencher as nossas expectativas?” (Stefan Kostka, Harmonia Tonal, pg.28)
Para descobrirmos como e onde encaixar cada acorde, é necessário saber a função que ele exerce em uma progressão (sequencia de acordes). Essa função é o valor expressivo de cada acorde, e que depende da relação dos outros acordes da estrutura harmônica. Essa relação dos acordes com a tônica é chamada tonalidade.
Existem três tipos de funções que um acorde exercerá em uma tonalidade: tônica, subdominante e dominante. Essas funções são exercidas pelos acordes vizinhos de quinta: quinta descendente (subdominante) e quinta ascendente (dominante) em relação à tônica. São esses, também, MAIORES em uma tonalidade MAIOR e menores em uma tonalidade menor.
A tônica é a região de repouso da progressão. Essa função é atingida pelo I, iii, vi no modo maior e i, III no modo menor.
A subdominante dá a sensação de movimento a progressão. ii e IV no modo maior,II°, iv, VI no menor.
A dominante transmite a ideia de afastamento que causa a tensão das cadências. V e vii tanto no maior quanto menor.
Agora, com a possibilidade de analisar a função de cada acorde em uma progressão, podemos realizar a análise harmônica de músicas tonais. Essas análises vão nos exemplificar como geralmente são aplicadas as funções na harmonia tonal, como os acordes se relacionam e quais as progressões mais usadas em determinados gêneros.
BOLO DOIDO,
Bm
Foi, foi, foi, foi, foi
G
Foi bolo doido
D
Foi… bolo doido
A
Sexta-feira tem de novo
O resto se repete encima da mesma progressão. Primeiro, temos que descobrir qual é a tonalidade para que a análise prossiga.
TONALIDADE MAIOR OU MENOR?
Geralmente, a canção começará no primeiro grau (I para tonalidade Maior e i para menor), mas nem sempre isso acontece. Se tomássemos Si menor como i, se trataria de uma tonalidade menor.
A característica do modo menor é seu caráter dramático, triste, melancólico… e não é isso que temos no Bolo Doido. A alegria é gritante e a empolgação é contagiante. Temos uma tonalidade maior. E então, como analisar esse Si menor?
ACORDES RELATIVOS
A segunda lei tonal responderá essa peculiaridade. Mas até aprofundarmos-nos no método de Koellreutter, lembre-se do conceito de “relatividade”, aquele das escalas menores. Toda escala menor tem uma escala maior relativa, e vice-versa. Essa relativa está uma terça menor acima (para escala menor)/abaixo (para escala maior). Esse conceito também funciona para acordes.
O acorde Bm é o relativo menor de outro acorde, que se encontra uma terça menor acima. Esse é o acorde de D, Ré Maior. Isso quer dizer que, funcionalmente, esses dois acordes tem o mesmo valor. Os dois tem função de tônica, o que os diferencia funcionalmente é a nomenclatura tônica relativa (Tr) que damos ao acorde relativo. O mesmo poderá ser feito na dominante e subdominante, onde serão Dr e Sr.*
*É bom lembrar que essa é a nomenclatura no modo maior. No modo menor, as funções são exercidas por acordes menores, e por isso, grafados minúsculos; e seus relativos, que são maiores, serão os maiúsculos. ex: t tR s sR D (a dominante sempre é maior) e Dr.
ANÁLISE HARMÔNICA
Agora devemos prosseguir em descobrir a tonalidade. Se Bm tem a mesma função harmônica de D, e Ré Maior é um acorde Maior que poderia ser o I da tonalidade, vamos testar a progressão em Ré Maior.
Introdução – Serve para estabelecer a tonalidade. Nessa etapa, o Ré Maior já está se estabelecendo:
|Bm| D |-> vi I
Tr T
Verso/Refrão – Aqui entra a progressão que se repete até o fim. É uma progressão bastante usada no sertanejo, e é a mesma de EU QUERO TCHU EU QUERO TCHA, sei lá de quem.
|Bm| G | D | A | -> vi IV I V
Tr S T D
AI SE EU TE PEGO, de Michel Teló.
B F#
Nossa, nossa
G#m E
Assim você me mata
B F#
Ai se eu te pego
G#m E
Ai ai se eu te pego
B F#
Delícia, delícia
G#m E
Assim você me mata
B F#
Ai se eu te pego
G#m E
Ai ai se eu te pego
E agora, qual o primeiro passo pra começar essa análise? Tonalidade. Maior ou menor? Alegre ou triste? Claramente alegre. Trata-se de uma tonalidade Maior, então pode muito bem ser o Si Maior que começa a canção. Deve-se estabelecer os graus da progressão em relação a essa tônica, e depois fazer a análise funcional desses graus. Muito simples:
| B | F# | G#m | E | -> I V vi IV
T D Tr S
Para dominar as progressões, deve-se analisar o maior número possível delas. Busque os acordes de suas canções favoritas na internet e realize a análise harmônica de cada uma. Experimente outras tonalidades na mesma progressão. Crie progressões novas e experimente no seu instrumento.
Esse foi o último post da série de teoria. De agora em diante, começaremos a série Harmonia, onde começaremos a por toda essa teoria em prática.